Quando já estávamos perto do palácio de Dom Baldo, mandei o
meu ajudante prender os nossos animais a um olmo e que fosse ao comércio
comprar dez reis de cevada fresca para lhes dar.
Olhei novamente para
o palácio quando estava a uns cinquenta passos de distância, o qual pela sua originalidade me causou espanto e admiração.
Um palácio de uma torre tão nobre naquela serra! Nem acreditava que fosse real o que
estava a ver. Era um palácio fantástico.
As paredes eram de
pedra. As pedras eram de um xisto invulgar, todas diferentes e de grande beleza.
Pareceu-me que tinham
vida e que se moviam em varias direcções, algumas mais rápidas e outras mais devagar, de acordo com a sua
inclinação. Outras estavam dormindo, outras associavam-se formando barcos à vela, esta
de tela fina, que transportavam a nossa imaginação em direcção às estrelas ou
até aos mistérios da origem do universo.
Como era possível não
chocarem umas com as outras! Talvez a Providência o quisera assim ou porque apesar de serem todas diferentes
tinham o mesmo valor, ou tinham um poder desconhecido que evitava a colisão.
Quando estava mais
perto tive a impressão que elas se moviam num lago de águas limpas e pouco depois não tinha dúvidas de que era mesmo
água boa para beber, como aquela das fontes mais famosas. Então apareceu uma mulher a
cantar, com um vestido da cor do fogo, sentada numa pedra que flutuava na água, a
qual se transformou numa mulher a fiar com uma roca à cinta e uma pedra à cabeça. Pôs
a pedra no chão, a qual passou a jorrar água como se fosse uma fonte. Acreditei que
de acordo com lendas antigas aquela água fosse milagrosa e que pudesse curar a
minha doença e a do jumento.
Aproximei-me para a beber e encher uma cântara de barro.
Surpreendentemente, ao tocar nas pedras a figura e o cenário desapareceram. Então
lembrei-me do que havia lido no livro sagrado, o Alcorão, que é mais ou menos assim:
ninguém deve tocar numa mulher muçulmana, a não ser o seu marido. Afastei-me das
paredes e logo continuou a cena interrompida. Sem tocar nas pedras enchi o cântaro do
jorro da água da fonte.
Um pouco mais
distante pareceu-me que as pedras andavam no espaço cósmico, semelhantes aos cometas e depois com o girar do sol algumas
brilhavam como as estrelas e outras espalhavam uma luz suave como a da lua
cheia. Talvez fossem mensageiras das estrelas e da lua.
Depois parecia-me que
tinham rostos jovens, calmos e encantadores. Provavelmente eram o espelho da beleza e serenidade de uma
pessoa ou fantasma que vivia dentro delas.
Elas eram a memória
do fogo antigo no interior da terra, da força erosiva dos ventos e da água, dos diferentes climas da terra e dos seres vivos
primitivos que com elas se fundiram.
O homem ao
observá-las impressionou-se com a sua beleza misteriosa, acreditou que transportavam os segredos do princípio do universo e
apaixonou-se por elas.
Para quem era aquela mensagem? Era para ele, e logo começou
a trabalhá-las para construir casas, castelos e palácios, impregnando-os da sua
imaginação criadora, dos seus sentimentos, dos seus sonhos, da sua cultura,
dando-lhes vida e criando quadros como os dos pintores famosos. Queria que a sua obra viajasse
no tempo.
A torre, também
construída de pedras semelhantes, era circular, e tinha várias janelas, algumas alinhadas com o nascer do sol no início do
Verão e do Inverno. Outras eram utilizadas para durante a noite observar o céu. Era
importante para os camponeses saberem quando se aproximava a época das sementeiras e das
colheitas.
Numa das suas pedras
estavam gravadas umas palavras em árabe e um desenho de um homem que observava os astros. Não tinha nenhuma ideia
sobre o significado daquelas palavras. De qualquer modo o desenho significava
certamente que a torre serviu de observatório astronómico dos mouros.
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